sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Uma Viagem Inesquecível.

Cheio que nem um ovo, o barracão das festas é um contentor de emoções. Uns choram, outros riem, outros desatam a bater palmas espontaneamente. Por vezes, faz-se um silêncio profundo e até as crianças se aquietam de olhos presos na tela vendo desfilar os barcos de pesca, as gentes da terra e os testemunhos dos pescadores, homens simples esculpidos nas ondas do mar, homens sábios com a vida que esgrimem argumentos, consoante interesses e meras opiniões, ora a favor, ora a desfavor da construção do porto de pesca de Porto Formoso.
Já lá vão dois anos desde que o polémico porto foi inaugurado, alterando para sempre a paisagem que dá nome à terra e que permanecia quase intocada há 500 anos. E é sobre isso mesmo o documentário Meu Pescador, Meu Velho que a espanhola Amaya Sumpsi quis estrear em primeira mão neste pedaço de paraíso à deriva no Atlântico: a ilha de São Miguel, nos Açores. Sobre isso e sobre um tema atual, o desenvolvimento sustentado, a eterna guerra entre o que permanece, mantendo a genuinidade dos lugares, e o que se transforma, em nome do progresso, formatando o mundo num estereótipo. Certo é que, desde que Amaya aqui chegou, em 2005, muito mudou em Porto Formoso.
Mas hoje é dia de festa em honra de Nossa Senhora da Graça, a padroeira, e no barracão adjacente às festas, ao lado da quermesse – recheada de bibelots indecifráveis – César é herói por um dia. “Ó meu rapaz, tu falaste muito bem”, dizem-lhe, e ele, ao lado da namorada, ora incha de orgulho, ora encolhe os ombros de vergonha. Estranhamente, o aplauso ao documentário é unânime. E não há quem se chateie com os pontos de vista antagónicos apresentados. César aparece várias vezes, desfiando redes no cimo de um monte e dizendo de sua justiça. Sobre Porto Formoso e sobre este mundo, “o que temos”.
Lá fora, as modinhas regionais e os hits pimba, já vão fazendo esquecer a polémica construção do porto – “a gente acaba por se habituar, não é? Qualquer dia ninguém se lembra de como isto era antes”. E cá dentro, põem-se mesas e desfilam petiscos bem temperados e bem regados, brinda-se ao futuro, que o passado, esse já está registado pelo olhar de uma madrilena que veio para os confins do mundo e se apaixonou pelas paisagens, pelas pessoas, e pelas suas vidas.
Texto Patrícia Brito fotos Marisa Cardoso

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